

Quando o jovem castrato chega à idade adulta, o seu corpo desenvolve-se, normalmente em termos de capacidade pulmonar e força muscular, mas a sua laringe não. A sua voz adquire assim uma tessitura única, com um poder e uma flexibilidade muito diferentes, tanto da voz da mulher adulta, como da voz mais aguda do homem não castrado (contratenor). Por outro lado, a maturidade e a crescente experiência musical do castrato tornavam a sua voz marcadamente diferente da de um jovem.
O termo castrato designa não só o cantor mas também o próprio registo da sua voz.
Os castrati na história
A prática de castração de jovens cantores (ou castratismo) teve início no século XVI, tendo surgido devido à necessidade de vozes agudas nos coros das igrejas da Europa Ocidental, já que a Igreja Católica Romana não aceitava mulheres no coro das igrejas. No fim da década de 1550, o duque de Ferrara tinha castrati no coro da sua capela. Está documentada a sua existência no coro da igreja de Munique a partir de 1574 e no coro da Capela Sistina a partir de 1599. Na bula papal de 1589, o papa Sisto V aprovou formalmente o recrutamento de castrati para o coro da Igreja de São Pedro.
Na ópera, esta prática atingiu o seu auge nos séculos XVII e XVIII. O papel do herói era muitas vezes escrito para castrati, como por exemplo nas óperas de Handel. Nos dias de hoje, esses papéis são frequentemente desempenhados por cantoras ou por contratenores. Todavia, a parte composta para castrati de algumas óperas barrocas é de execução tão complexa e difícil que é quase impossível cantá-la.
Muitos rapazes que eram alvo da castração eram crianças órfãs ou abandonadas. Algumas famílias pobres, incapazes de criar a sua prole numerosa, entregavam um filho para ser castrado. Em Nápoles, recebiam a sua instrução em conservatórios pertencentes à Igreja, onde lecionavam músicos de renome. Algumas fontes referem que muitas barbearias napolitanas tinham à entrada um dístico com a indicação "Qui si castrano ragazzi" (Aqui castram-se rapazes).

O último castrato a abandonar o coro da Capela Sistina foi Alessandro Moreschi, em 1913 (foto).
Na segunda metade do século XVIII, a chegada do verismo na ópera fez com que a popularidade dos castrati entrasse em declínio. Por alguns anos, ainda existiram desses cantores na Itália.
Com o tempo, porém, esses papéis foram transferidos aos contratenores e, algumas vezes, às sopranos.
O filme "Farinelli"


Aparece como um galã, de olhar triste e solitário, que encerrou carreira como cantor exclusivo do rei Felipe V da Espanha, que o contratou porque seu canto era a única coisa que o tirava da depressão.
No longa-metragem, Farinelli vive um embate com o compositor Haendel, que quase vai à falência quando o astro rouba o público de seu teatro para o do concorrente.
Na época dos castrati, a estrela era o cantor; a música, portanto, deveria estar a serviço dele. E o filme toca nesse assunto quando Haendel descarrega em Farinelli todo seu ódio. De ambas as partes, era uma relação alimentada por admiração e raiva.
Farinelli alcançava 3.4 oitavas, do Lá2 até o Ré6, com sua voz e, dizem, tinha a capacidade de sustentar 150 notas em um só fôlego. Para fazer o filme, foi necessário juntar a interpretação de dois cantores, um contratenor e uma soprano coloratura.
Como não há gravações, ninguém sabe dizer ao certo como era a voz de Farinelli e de seus contemporâneos. Há apenas alguns registros do último castrato, Alessandro Moreschi (1858-1922), que serviu na Capela Sistina e, entre 1902 e 1904, gravou dez discos. Tessitura usual: Lá2 ao Fá5.